Sempre fui um entusiasta das câmaras de comércio e indústria e, num certo sentido, um propagandista das suas virtualidades.
Frequentador, mais ou menos assíduo, dos eventos promovidos por algumas delas, fiz, ao longo de anos, muitos amigos em congressos e conferências da iniciativa de câmaras de comércio e indústria e tive a oportunidade de acompanhar alguns negócios proporcionados pelo encontro de pessoas em tais ocasiões.
O principal potencial das câmaras é esse mesmo: o de difundir oportunidades de negócio e o de criar condições para que, por via do encontro de pessoas, os negócios se desenvolvam, desde a simples ideia até à concretização.
Desde muito cedo me apercebi de algumas perversões; e casos houve em que aconselhei pessoas que se tinham conhecido em encontros das câmaras e que tinham iniciado negócios efetivos, a guardas segredo sobre os mesmos, para evitar o risco de eles serem perturbados.
É que, mais do que fomentar negócios, os dirigentes das câmaras assumem, não raras vezes, a vontade de serem eles próprios sujeitos de concretos protagonismos, no quadro dos mesmos.
Tenho para mim como elementar que os dirigentes das câmaras de comércio e indústria não deveriam aceitar participar em de negócios concretos por elas propiciados sem, no mínimo, informarem os sócios do mesmo ramo de que algum empresário ou alguma empresa procura um parceiro ou um fornecedor de bens ou serviços com determinadas características e sem informar esse alguém do leque de opções de escolha que se lhe oferecem entre os sócios da câmara.
E isso porque a livre concorrência é um elemento essencial do escopo destas instituições, que definham e se tornam até nocivas, quando os seus dirigentes cuidam dos seus próprios interesses, ao invés de proteger esse valor, em benefício de todos.
É urgente iniciar e desenvolver um debate sobre a ética nas câmaras e atalhar caminhos, sob pena de muitas delas acabarem por morrer, após um definhamento, mais do que evidente nos últimos anos.
Há câmaras de comércio e indústria bilaterais que têm menos de 100 associados e só sobrevivem de balões de oxigénio facultados pelas entidades públicas.Isto só acontece porque o valor acrescentado pela participação nas câmaras de comércio se vem degradando, ao ponto de levar os empresários à conclusão de que não vale a pena nem faz sentido pagar a respetiva quota por mera intenção de benemerência.
Uma câmara de comércio não tem a mesma natureza que uma associação de bombeiros voluntários.
Ou é uma entidade pragmática e limpa nos seus usos, que promove iniciativas que possam produzir algum resultado no plano do desenvolvimento dos negócios, ou não vale a pena pertencer-lhe.
As câmaras de comércio e indústria não podem nem devem ser meras correias de transmissão dos interesses pessoais dos seus dirigentes. É absolutamente essencial assumir como valor primeiro do seu funcionamento que as propostas de negócio entradas nas suas secretarias sejam difundidas ao menos no círculo dos respetivos sócios, em vez de serem endereçadas às empresas dos dirigentes, como se eles fossem os donos da câmara e gozassem, por isso, desse especialíssimo privilégio.
As câmaras de comércio e indústria não podem nem devem ser organizações mais ou menos mafiosas que, arvorando, embora, a bandeira da defesa da concorrência, a matem logo nas secretarias por via da exclusão dos interesses dos próprios associados, em que essas práticas comuns redundam.
Num momento especialmente difícil para a vida das empresas, como é o momento atual, as câmaras de comércio e indústria podem ter um papel relevantíssimo se assumirem as suas funções com lisura e com ética.
Mas teremos que as encarar como perniciosas se persistirem nestes e noutros vícios.
O valor acumulado das quotas que muitas empresas pagam para pertencer a um conjunto de câmaras pode ser bem mais útil investido em várias alternativas que a sociedade nos oferece.
É uma ponderação que estamos a fazer, caso a caso.