Acrescentam-se explicações que parecem razoáveis. Ainda bem...
Não há nenhum escândalo com Manuel Alegre... Fico alegre.
Há é uma questão de fundo por resolver que é a do favorecimento pessoal que os legisladores se dão a eles próprios, atribuindo-se privilégios que ninguém mais tem.
Deveriam ser os primeiros a ter vergonha.
Como é que se pode falar de ética?
Diz o DN:
«No primeiro dia de férias, que ontem começou a gozar nos Açores, Manuel Alegre foi surpreendido com a notícia sobre a inclusão do seu nome na lista mensal de aposentados e reformados da Caixa Geral de Aposentações (CGA) para o mês de Agosto.
E reage com a maior das indignações em declarações ao DN: "É a coisa mais miserável que me fizeram na vida. Nem no tempo do Salazar..." Helena Roseta, uma das suas maiores apoiantes, reage no mesmo tom: "É uma tentativa de assassinato político".
Também ao DN, a ex-deputada e membro da comissão nacional do PS, considerou "muito estranho que num dia se conheçam as faltas dos deputados na Assembleia da República e falem dele no dia seguinte se saiba da reforma", acrescentando: "É terrível e difícil acreditar que isto é inocente".
Quem acredita na inocência de Alegre é o PS, que ontem se mobilizou em defesa do seu militante histórico, parecendo enterrar de vez as feridas que ficaram abertas na recente eleição presidencial.
O próprio José Sócrates telefonou ao poeta, transmitindo-lhe a sua solidariedade e a indignação pela notícia ontem divulgada. Alegre, segundo a referida lista, tem direito a receber 3219,15 euros de reforma da CGA como coordenador de programas de texto da Radio Difusão Portuguesa, cargo que desempenhou durante alguns meses a seguir ao 25 de Abril.
Ao DN, Alegre garantiu que não recebe "nenhuma reforma da rádio" e explica: "Como trabalhei alguns meses na rádio e sempre mantive esse vínculo, no meu regime contributivo, ao longo destes 30 anos, está uma parte da rádio. Mas isso é muito pouco, é quase uma insignificância naqueles três mil euros e tal que é a reforma a que tenho direito pelos descontos que entretanto efectuei".
O também vice-presidente da Assembleia da República insurge-se contra as notícias sobre a reforma e diz que tudo não passa de "uma mentira e infâmia que visa atingir uma pessoa impoluta", reagindo com indignação: "Nunca enriqueci com a política.
Nunca ninguém me comprou nem comprará. Sempre me bati por valores éticos e morais."Helena Roseta corrobora estas afirmações, lembrando que Alegre se limitou a manter o vínculo à RDP e que os descontos dizem respeito "a trinta e tal anos de trabalho como deputado. É completamente abusivo o que se disse".
Vítor Ramalho, deputado do PS e um elemento muito próximo de Mário Soares, sai em defesa do rival nas últimas presidenciais e adianta que a polémica "nada tem a ver com Manuel Alegre, mas com a circunstância de ele ser político e de se viver hoje numa altura em que a reforma da Segurança Social afecta as expectativas de muitos e é socialmente quente".
Ramalho garante que Alegre se limitou a "manter o vínculo à RDP" e que depois, quando transitou para o Governo em 1975 (com a tutela da Comunicação Social), ficou com o vínculo suspenso, mas com as garantias sociais intactas".
Segundo este deputado, "ninguém pode ser prejudicado por exercer funções governativas ou parlamentares".
Também ao DN, o dirigente nacional do PS José Lello assegura que Alegre "não cometeu nenhuma ilegalidade".
Uma declaração significativa, vinda de um adversário do poeta nas fileiras socialistas.No passado dia 16 de Maio, Alegre completou 70 anos. Sendo funcionário público, a CGA notificou-o directamente: o poeta nega ter desencadeado qualquer mecanismo para esse efeito:
"É um procedimento automático. Eu nem me lembrava disso, tal como não me lembrei quando fiz 65 anos e podia tê-lo feito, como fez, por exemplo, o Jorge Sampaio."
O economista Eugénio Rosa, especialista na matéria, diz o mesmo: "Como nunca se desligou da RDP, chegou aos 70 anos e foi reformado 'compulsivamente'.
A pensão não diz respeito só à RDP, mas sobretudo às funções de deputado. Aliás, os valores até são equivalentes ao ordenado médio de um deputado".
Eugénio Rosa acrescenta até que Alegre terá direito "a outra reforma, para a qual nem descontou, que é a subvenção mensal vitalícia como deputado".
Alegre reagiu ainda com indignação às declarações do líder do PSD, Marques Mendes, que aproveitou a notícia para exigir esclarecimentos públicos. "Em política não vale tudo", subinha o poeta, desbafando: "Isto está a ficar tão difícil que dá vontade de emigrar outra vez!" »