domingo, outubro 20, 2019

Influenciar os outros...


20 de outubro de 2019

Uma coisa é comentar factos que já ocorreram; emitir opinião sobre o passado e o presente, para influenciar os outros.
Outra coisa é fazer afirmações sobre o que será o futuro, em jeito de prevenção do futuro.
Há quem diga que a ciência política tem muito disso, de previsão, adivinhação e previsão. Pura mitomania.
Não é possível prever o futuro de forma científica e, muito menos, de forma rigorosa.
Fazer afirmações sobre o que vai acontecer é, no essencial, uma fraude.
É muito triste ver jornalistas a fazer isso todos os dias, quando é certo que um dos mais importantes deveres desses profissionais é  o de informar com rigor e isenção.
O rigor tem a ver, no essencial, com o respeito pela factologia. A isenção tem a ver, especialmente, com a independência.
A norma que impõe o exercício do jornalismo com “rigor e isenção” está na alínea a) do artº 14º do Estatuto do Jornalista. Mas logo a seguir, na alínea b), determina a mesma lei que o jornalista deve respeitar a orientação e os objetivos definidos no estatuto editorial do órgão de comunicação social para o qual trabalhe.
O estatuto editorial é, por natureza, um espartilho que, por regra, ninguém cumpre.
O Código Deontológico dos jornalistas portugueses dispõe o seguinte, logo no seu ponto 1:
O jornalista deve relatar os factos com rigor e exatidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público.”
Todas as mensagens que misturem a noticias com a opinião são, clara e inequivocamente violadoras desta norma do Código Deontológico.
Mas bem mais grave do que essa mistura é a transformação do jornalismo e do comentário numa espécie arte divinatória, só faltando jogar os búzios ou as cartas.
Por regra, essas mensagens destinam-se a influenciar, em vez de fornecer informação que permita a cada cidadão formar a sua opinião.
A propaganda política tem, no essencial, esse objetivo, não impondo a lei nenhuma restrição em matéria de rigor, objetividade ou independência, o que bem se compreende. Diga-se, de passagem que as publicações não informativas não estão obrigadas a ter estatuto editorias, sendo duvidoso que os seus jornalistas estejam obrigados ao respeito pelo Código Deontológico.
Está tudo – com necessidade de uma leitura atualística – no excelente libro de SERGE TCHAKHOTINE, Le Viol des Foules par la Propagande Polítique.
Um dos maiores problemas do nosso tempo está no colapso do sistema de comunicação social, tal como ele foi concebido e realizado na última metade do século passado e na sua substituição por um não sistema, absolutamente desregulado e não regulável.
Na semana passada, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, recebeu em Belém 40 cidadãos que são considerados influenciadores, porque são seguidos por muitas pessoas na Internet.
Fez bem. Alguns dos influencers – que é assim que chamam a essa rapaziada, têm mais seguidores que o chefe do Estado e mais leitores que todos os jornais juntos.
Hoje, o LLM disse na TV que  a composição do novo Governo “é o primeiro erro político de António Costa” e que  o novo Executivo é “um Governo velho, a continuação do anterior”. Como “só tem duas caras novas”, é mais “uma remodelação” e portanto “sabe a muito pouco”.
Isto não é nem informação nem comentário político independente. É opinião política, comprometida e militante.
Aliás, é absolutamente lícito que a estação de televisão liderada por um antigo primeiro-ministro, filiado no PPD-PSD promova os interesses desse partido.
O que não deve é vender-se gato por lebre: LLM é, também, um antigo líder do mesmo partido, com interesses próprios na influência dos eleitores.