Leio-a numa noite fria de S. Paulo, pouco depois de ter chegado de Fortaleza.
Diz, em certo passo, Seixas da Costa, respondendo à jornalista que lhe perguntava porque foi apra a diplomacia:
«Para mim, isso não foi um esforço, tinha o gosto pelas temáticas internacionais. Comecei a assinar o «L’Express» aos 18 anos. Um último aspecto: saber viver no estrangeiro, adaptarmo-nos a mundos diferentes, à barreira das línguas e, todos os três ou quatro anos, criar novos amigos, lidar com novos interlocutores, recomeçar tudo de novo, da montagem da casa à arrumação dos livros... E há os problemas familiares. A diplomacia aparece ligada ao «glamour», havendo mesmo alguns patetas que ainda falam da «diplomacia do croquete». Não se diz que o facto de alguém casar com um diplomata quase sempre significa a morte anunciada da sua própria carreira profissional, obrigando a uma dupla exclusividade.»
Estimo tanto o Dr. Seixas da Costa que, naturalmente, lhe perdoo a deselegância.
Um desses patetas sou eu, como é sabido de muitos dos leitores.
Lembro-me, recentemente, de ter usado a expressão, de forma algo contundente, por duas vezes.
Há uns dois ou três anos, não recordo bem, quando o Brasil organizou, em Fortaleza, um encontro Brasil-Africa, que reuniu vários ministros das relações exteriores e de pastas económicas de paises africanos e de países de lingua portuguesa, fazendo coincidir esse evento com um Encontro de Empresas dos Países de Lingua Portuguesa.
Isso coincidiu com o 10 de Junho e Seixas da Costa ainda não estava no Brasil.
Houve umas recepções em Brasilia e no Rio de Janeiro e não havia nenhum representante do Estado português em nenhum desses dois eventos, chegando-se ao ponto de se ter que convidar Pedro Pires, presidente da Cabo Verde, para presidir ao jantar do Dia de Portugal.
O caso mais recente de «diplomacia do croquete» foi mais expressivo.
O ICEP organizou uma recepção aos principais importadores de vinhos de um pais da Europa Central, tendo sido usada a residência do embaixador para esse evento.
A certa altura do banquete faltou a comida: um delicioso vitello tonato, que ligava muito bem com os vinhos portugueses.
Uma zelosa funcionária foi procurar saber o que se passava, quase como o J. Cristo nas bodas de Canaan, tendo constatado que vinho não faltava mas que a comida tinha sido desviada para a despensa do embaixador, com prejuizo do prestigio do banquete.
Indignada, a funcionária reclamou a devolução, acabando por ser acusada de ter roubado uma colher de prata e de ser enxovalhada com correspondência para toda a sua entourage.
Há um processo crime a correr em Lisboa mas...
Não falo do Brasil, porque as coisas mudaram, efectivamente com a vinda de Seixas da Costa, que é um diplomata que considero muito.
Tanto que não fico ofendido com o barrete de «pateta» que enfio em toda a plenitude.
A diplomacia do croquete existe e tem muita força...
Pena é que, em certos países, seja a única área com alguma eficácia.
Passada essa desnecessária manifestação corporativa, a entrevista é notável.
Vale a pena ler.