segunda-feira, maio 07, 2007

Furacão

Citação:

Polícia do Brasil investiga ligações a elementos do PS

Autoridades suspeitam de que detidos recorressem à influência do secretário de Estado das Comunidades e de Aníbal Araújo.


"Você sabe que o de Lisboa não foi nada de licitação não, inclusive a licitação do chinês lá de Macau", continua o advogado. O presidente da Associação de Bingos completa que "o de Macau é um gigante".

Nuno Amaral, Rio de Janeiro
A Polícia Federal do Brasil está a investigar as ligações entre os detidos na Operação Furacão e alguns elementos do Partido Socialista. Depois de ter já pedido às autoridades portuguesas para bloquearem contas bancárias pertencentes a off-shores registados na ilha da Madeira, o Ministério Público brasileiro solicitou a intervenção da Interpol para averiguar as ligações do grupo, nomeadamente em Portugal. A Polícia Federal (PF) suspeita de que pelo menos dois dos detidos recorressem à influência do secretário de Estado das Comunidades, António Braga, e de Aníbal Araújo, candidato socialista em 2005, e a autarcas do PS para expandir os negócios do grupo, conhecido como "Máfia dos Bingos", em Portugal e Macau. O grupo é suspeito de envolvimento na compra e venda de sentenças judiciais e decisões políticas para beneficiar casas de bingo e de máquinas de jogos de azar. Dois dos 25 detidos nesta megaoperação são empresários portugueses, sendo certo que um deles, Licínio Soares Bastos - que chegou a ser nomeado cônsul pelo Governo de José Sócrates - foi o principal financiador da campanha do PS no Brasil em 2005, que teve como cabeça de lista Aníbal Araújo, e é proprietário do imóvel onde está instalada a sede dos socialistas no Rio de Janeiro.
Numa das escutas telefónicas registadas pela PF a 2 de Setembro de 2006, o advogado brasileiro Jaime Garcia Dias pede a outro homem de nome "Adolfo" para falar com um presidente de câmara da região de Braga, dizendo que é "conhecido de António Braga, secretário de Estado" das Comunidades - o governante é também presidente da Assembleia Municipal de Braga.
Os dois brasileiros estudavam a forma de desembargar um obra e colocar máquinas de jogo num hotel. "O presidente de câmara é do PS?", pergunta Jaime Garcia Dias, entretanto detido, a "Adolfo", que, na altura, estava em Portugal. Na mesma escuta, o advogado brasileiro sugere a intervenção de "Aníbal", dizendo que "ele resolve isso na hora". A Polícia Federal suspeita de que os dois se referissem a Aníbal Araújo, candidato do PS ao círculo fora da Europa em 2005, cuja campanha foi apoiada por Licínio Soares Bastos, um dos empresários portugueses detidos nesta operação.
Um ano depois das legislativas de 2005, o empresário português veio a ser nomeado pelo secretário de Estado António Braga cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, perto do Rio de Janeiro, em despacho datado de 16 de Maio de 2006. Ontem, o Governo português fez saber que travou a nomeação de Licínio Bastos para esse cargo "assim que se soube das investigações das autoridades brasileiras no processo conhecido como "Máfia das Sentenças" (ou "Máfia dos Bingos").
Contactado pelo PÚBLICO, Aníbal Araújo, que também preside à União Portuguesa da Imprensa Regional (Unir), que realiza durante este fim-de-semana um congresso em Salvador da Bahia, no Brasil, optou por não prestar declarações. Também presente neste encontro, António Braga, secretário de Estado das Comunidades, fez saber, através do assessor de imprensa, que "conheceu apenas Licínio Bastos, pessoa que considera um benemérito da comunidade portuguesa até que haja uma condenação". "O sr secretário de Estado desconhece por completo os restantes detidos nessa operação", disse o assessor de imprensa, Eduardo Saraiva, que, em 2005, participou, "enquanto cidadão", frisou, na campanha de Aníbal Araújo no Rio de Janeiro.
Casino, Lisboa e deputados
No congresso da Unir, organizado por Aníbal Araújo em Salvador da Bahia para debater a imprensa regional portuguesa e as relações com as comunidades, participou também o presidente da Câmara de Espinho, o socialista José Mota, deputados do PSD, jornalistas e o embaixador de Portugal no Brasil, Seixas da Costa.
Em Outubro de 2006, a Polícia Federal intercepta também um telefonema do advogado brasileiro Jaime Garcia Dias, que na altura estava em Portugal, para José Renato Granado, presidente da Associação de Bingos no Rio de Janeiro. "Eu já tive uma reunião com aquele outro negócio daquele outro investimento", diz Garcia Dias. A PF suspeita que se referissem à abertura de um casino em Portugal. "Você sabe que o de Lisboa não foi nada de licitação não, inclusive a licitação do chinês lá de Macau", continua o advogado. O presidente da Associação de Bingos completa que "o de Macau é um gigante".
Neste telefonema, datado de 20 de Outubro de 2006, Jaime Garcia Dias admite que está por conta de um presidente de câmara e expõe que se vai reunir com deputados. "Ficaram uns deputados de marcar um encontro comigo na terça ou quarta-feira. Que eu falei: a gente tem que tratar desse ponto aqui, agora a gente tem que chegar num ponto de valor, chegou no ponto da data da licença", anuncia. "Beleza", responde o responsável pelos bingos no Rio de Janeiro.
Em escutas realizadas dias mais tarde, Jaime Garcia Dias expõe a Evandro da Fonseca, também detido nesta operação, que irá encontrar-se com portugueses numa feira de Londres para "avançar com aquilo para a gente". Os dois combinam depois um encontro em Portugal, sem especificar onde.
António Braga é citado numa das escutas da polícia, mas já afirmou desconhecer o homem que fala no seu nome

Nuno Amaral publico.pt