quinta-feira, novembro 24, 2005

Acrobacias...

Vai realizar-se, no dia 1 de Dezembro, um almoço com o Embaixador Francisco Seixas da Costa, promovido pelo Conselho da Comunidade Portuguesa de S. Paulo, na Casa de Portugal.
A matéria foi hoje objecto de comunicação pelo Presidente em exercício da CP, Dr. Fernando Leça, que se regozijou com o facto de a comunidade ter, finalmente, um interlocutor, mesmo que ele venha de Brasília.
Um drama é o da eventual presença do cônsul actual – um tipo de quem não me lembro o nome… - que é a personificação da injúria à Comunidade Portuguesa.
Não tenho nada contra o funcionário em causa, que nem sequer conheço e de quem nem sequer me lembro do nome.
Foi um erro de casting do governo anterior, que este governo tem que resolver urgentemente.
O homem tem o posto de embaixador e foi posto em cônsul, o que, seguramente, não aconteceria se fosse pessoa competente. Mas nestas coisas há regras: se é embaixador, deve ser colocado no sítio conveniente, não me chocando nada se o mandarem para a Gambia, para o Togo ou para um desses países esquisitos, de que também não lembro o nome, como é adequado.
Quando a criatura chegou à cidade, os líderes ficaram à espera que se apresentasse e dissesse ao que vinha, como era de bom-tom.
Nunca o fez, passando como cão por vinha vindimada perante quase todos eles e ignorando – porque só despreza quem pode – a generalidade dos dirigentes associativos. O porteiro que abriu portas a mais de uma dezena de figuras que antecederam a criatura, nunca mais ouviu um bom dia e o almoço das quintas nunca mais teve a presença do funcionário que representa a administração portuguesa no Estado e que é suposto relacionar-se com a Comunidade Portuguesa, como o fazem a generalidade dos nossos diplomatas e os dos países da União.
Nunca compareceu em nenhum dos eventos culturais da casa mater dos portugueses de S. Paulo, como se tivesse nojo destes energúmenos em que fomos transformados todos nós.
Depois foi a polémica – e injustificada mudança do Consulado.
Se fosse uma coisa clara (e é escura) e justificável, teria o aplauso de todos. Uma Loja do Cidadão, como foi prometido, que até nem tinha que ficar obrigatoriamente na Casa de Portugal, mas poderia ser instalada num edifício de escritórios da Paulista ou de Moema, num edifício funcional e moderno, com todas aquelas características que devem ter os serviços públicos, de acordo com o que são as regras portuguesas e com o que se contém na Carta Europeia do Serviço Público, tudo bem.
Mas não: o Consulado mudou para uma vivenda, inacessível ao público, no quadro de um negócio de legalidade muito duvidosa, nos aspectos que se conhecem e sobretudo nos que não se conhecem.
É preciso muita força e determinação – para não dizer força bruta – para enfrentar como a criatura enfrentou, com o maior silêncio, as principais forças vivas da terra, desde os lideres da Comunidade Portuguesa até aos representantes dos cidadãos brasileiros no município e no parlamento do Estado.
A criatura enfrentou e afrontou tudo e todos, com um poder que ninguém ousava imaginar na pequenez das suas calças curtas. Fechou as portas da repartição consular, absolutamente à margem da lei, impediu o acesso dos pobres, terceirizando o apoio social, instalou-se no silêncio da sua torre de marfim, a que chama «residência oficial», como se fosse um reizinho montado num cavalo de pau.
Com isto gerou ódios, admirações, indiferenças e até anedotas daquelas que se contam dos portugueses no Brasil.
«Sabem como é que os portugueses acabam com as filas à porta das repartições?»
«Fecham as repartições».
É evidente que quem frequenta os pequenos círculos do poder, mesmo que ele seja meramente fáctico, como é o de todas as prepotências, tem vocação para admirar, porque vive, como é natural, do oportunismo, que é incompatível com a massa crítica. Os oportunistas transformam as anedotas em coisas reais, ditas com ar sério, numa pose de estado.
Não estou, naturalmente, a insinuar que o Prof. Cavaco Silva é um oportunista, pelo facto de na sua recente visita ter aplaudido a anedota.
Estou a referir-me aos outros, que traem os que neles confiaram e que mentem aos que neles confiaram. Mas uma sociedade sem oportunistas também não tem graça nenhuma. Se eles não existissem eu não teria argumento para este pequeno naco de prosa.
Confrangido fico com o cansaço e a indiferença de muitos dos que se indignaram e agora se remetem ao silêncio, com a complacência dos cúmplices, porque mudou o governo. Não vou dizer que não são gente séria porque ontem diziam uma coisa e hoje se dispõem a engolir o que eles próprios disseram.
Rio-me, dou mesmo gargalhadas, numa extensão das memórias de infância, em tardes de circo. Confesso que sempre apreciei aquelas partes dos palhaços e dos acrobatas. Aqui alguns dos palhaços até são meus amigos, o que melhora a qualidade do espectáculo.
A política não pode ser, porém, uma actividade circense.
Estive entre os organizadores do almoço de campanha do Dr. Mário Soares e fui um dos responsáveis pela organização da mesa em que o mesmo se sentou.
A criatura inscreveu-se como era seu direito e, obviamente, que não a colocamos na mesa em que se sentou o candidato presidencial. Mas como o Dr. Júlio Rodrigues (a quem estava destinado o lugar) se atrasou, o indivíduo aproveitou para, numa atitude de penetra lhe ocupar o lugar, o que até não foi mau, porque ouviu o que tinha que ouvir, em lugar de melhor visibilidade.
Tanto quanto me disseram hoje, ainda não pagou o almoço, deixando o Joaquim Magalhães e o Fernando Miguel a arder, como aconteceu com mais meia dúzia de caloteiros convivas.
Como disse hoje Fernando Leça, é motivo de regozijo o convívio do Embaixador Seixas da Costa com a Comunidade Portuguesa de S. Paulo. É um diplomata culto, sensível e atento, que estou certo que tem condições para operar um virar de página nesta triste história.
Foi com o sentido de «virar de página» que foi anunciado o almoço.
É importante que o mesmo não seja uma palhaçada, mas um almoço sério.
Não pode ser um «passar de testemunho» como o que alguns estão a tentar preparar fazendo, como aqui se diz, uma «saia justa» ao Embaixador Seixas da Costa e desrespeitando um homem que, com todos os defeitos que possa ter, tem a virtude da frontalidade que têm os transmontanos.
Queiramos ou não, fazer este almoço sem a presença de António dos Ramos e com a presença da criatura tem um sabor de traição, depois de tudo o que se passou.
Talvez a criatura nem comparecesse pois que todos adivinhamos como seria o discurso do Comendador.
Dramático é que isto se está a desfazer, com uma progressiva decadência das elites liderantes. O mesmo espectáculo degradante – embora dégradé - a que assisti em Lisboa, ainda recentemente, quando uma série de amigos meus mudaram de roupa e de ideias para se colocarem na fila dos que procuram emprego.
Boa sorte, Dr. Seixas da Costa.