Correio da Manhã
O anúncio pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros de que apresentar um breve um diploma que permite acabar com as nomeações políticas para as embaixadas e consulados é, com os argumentos que vêm aduzidos, uma enorme hipocrisia. Mas, mais grave do que isso, configura um enorme erro, que vai custar ao Estado muito mais do que o que vai poupar.
As nomeações políticas não têm nada de mal, se forem bem administradas.
Bem pelo contrário.
Fixemos primeiro o que entendemos por nomeação política: é a nomeação, para o exercício de funções públicas, por via contratual, de uma pessoa que a Administração entende que, pelos seus conhecimentos e pela sua personalidade, melhor de adequa à realização de tarefas concretas ou ao cumprimento de determinada missão.
Não faz nenhum sentido que o porta-voz do Ministério seja um funcionário de carreira, como não faz nenhum sendido que os adidos de imprensa das embaixadas sejam funcionários de carreira.
Muito menos sentido faz que sejam funcionários de carreira do Ministério dos Negócios Estrangeiros os técnicos que têm que acompanhar determinados dossiers nas missões com elevado pensor técnico.
Nestas missões até há circunstâncias que justificariam que os próprios embaixadores fossem políticos.
Não temos uma escola superior de formação de diplomatas.
Os nossos diplomatas são diplomatas de tarimba, uns melhores do que outros, mas todos com essa mesma característica.
Não há em Portugal uma formação diplomática que se possa qualificar de académica e muito menos de científica. Com isso perde muito o exercício da função política do domínio da política externa.
Por isso mesmo se justifica que o Governo não deva abdicar do poder e do direito de, por via das nomeações políticas, possa corrigir as deficiências do aparelho do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
A lógica deve ser a de escolher as pessoas mais adequadas para as respectivas funções.
Sem prejuizo de a especificidade das funções diplomáticas e consulares justificar que haja um quadro próprio de diplomatas, parece-me que é preciso mexer nas leis, em termos que permitam o acesso a esse tipo de funções de funcionários de outros de outras áreas da Administração. Não há nenhuma razão que justifique que a carreira diplomática seja uma carreira absolutamente fechada e, num certo sentido, auto-gerida.
Bem pelo contrário, justifica-se que a lógica actual seja posta em causa, nomeadamente por via da sujeição às mesmas regras de controlo e inspecção a que estão sujeitos os demais serviços públicos.
Isso poderia melhorar, de forma extraordinária, a qualidade da prestação dos serviços públicos e a qualidade do exercício da função diplomática.
Há personalidades que, sem serem funcionários, demonstram ser capazes de ser excelentes ministros, administradores de empresas, negociadores de grandes projectos. Porque é que estas mesmas personalidades não hão-de poder ser embaixadores?
Mas é a outros niveis que a questão ganha mais acutilância.
Com o nivel de aptidões e de exigências que é feito a um cônsul, não tenho quaisquer dúvidas de que qualquer jurista com uma especial preparação na área dos registos e do notariado poderia exercer as funções com melhor qualidade do que muitos dos diplomatas que hoje ocupam os postos consulares. Em especial, não tenho quaisquer dúvidas de qualquer conservador/notário de uma qualquer comarca de terceira poderia exercer as funções com muito melhor qualidade.
O mesmo pode e deve dizer-se relativamente aos funcionários. Porque não hão-de alterar-se as leis em termos que permitam a mobilidade e o acesso de funcionários que o Estado já tem, com preparação adequada, para o exercício de determinadas funções?
Um dos maiores erros do actual sistema está na forma absolumente fechada do acesso aos lugares administrativos em embaixadas e consulados. Aí é que seria muito interessante fazer concursos documentais abertos, em vez de se contratarem funcionários sem preparação e sem experiência, às vezes mesmo sem a mínima noção do que é o País.
Perguntem aos gestores das Lojas do Cidadão como se resolvem esses problemas que eles sabem.