quinta-feira, novembro 10, 2005

Uma refugiada explorada

Joulia é russa e vivia em Belgrado quando estoirou a guerra.
Fugiu, como tantos outros, e foi parar ao Brasil, onde recebeu a solidariedade de amigos.
Com a Federação Russa a viver uma grande instabilidade, quando o seu passaporte estava à beira de caducar, propuseram-lhe que se naturalizasse brasileira.
Seguiu o conselho e entregaram-lhe um passaporte brasileiro, passando ela a chamar-se Julia, com o apelido russo que tinha.
Numa tentativa de se aproximar da sua terra rumou à Suiça, onde conheceu o português Miguel.
Namoraram, ela ficou grávida e nasceu Mikael, que foi registado no Consulado do Brasil em Zurique e recebeu um passaporte brasileiro.
Casaram dois meses depois e registaram o casamento no Consulado do Brasil.
Júlia vinha todos os anos ao Brasil e nunca sonhou que pudesse haver alguma irregularidade na sua naturalização.
Estava em S. Paulo, em 2 de Junho de 2004, com o passaporte quase a caducar e dirigiu-se à Polícia Federal para proceder à sua renovação. Foi presa porque se verificou que, sendo embora válido o passaporte, estava viciado o processo de naturalização.
Conseguiu convencer o tribunal da sua inocência; mas não poderia conseguir que a naturalização se mantivesse.
Os documentos do menor também foram apreendidos; ele, que era brasileiro por ser seu filho passou a ter o estatudo de apátrida e a não dispôr de nenhum documento.
Miguel, que vive em Genebra, foi ao Consulado de Portugal nessa cidade e informaram-no de que o modo mais expedito de regularizar a situação da criança seria o de proceder ao registo do seu nascimento no Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, onde deveriam comparecer ele próprio e sua mulher.
Mas o Consulado de Portugal está de porta fechada e Miguel, que, por razões profissionais, viajava apenas quatro dias em cada mês para o Brasil, nunca conseguiu sequer uma entrevista na repartição consular.
O meu colega de escritório Roberto Linhares telefonou, enviou mensagens de fax, enviou e_mails e também não conseguiu, ao longo de meses marcar uma entrevista com a representação portuguesa.
Joulia recebeu uma comunicação do Tribunal que a obrigava a sair ontem do país.
O tempo começou a fugir com demasiada velocidade.